Media Relations e a Reputação das Organizações | Pt. 2

Hoje, voltamos a conversar sobre a Reputação das Organizações. Esse elemento, que, como em quase tudo na disciplina das Relações Públicas, não traz consenso em muitas componentes que lhe são intrínsecas. Há algumas semanas atrás, iniciei uma reflexão acerca deste tema em relação às Media Relations, que complementei com questões que gostava de ver resolvidas. Mas, como seria de esperar naquilo que às Relações Públicas diz respeito, não encontrei resposta para todas – e, particularmente, não encontrei resposta para uma das minhas inquietações.

Mas vejamos – a verdade é que a Reputação e a Gestão de Reputação não são assuntos novos: as organizações e os indivíduos, organizados de forma formal ou informal, desde sempre que mostram preocupação com a forma como os outros, como os seus públicos, os percecionaram. Aquilo que mudou foi, por outro lado, a forma como as organizações começaram a dar importância a este assunto, dentro sua política e cultura organizacional. A Reputação começou a deixar de ser olhada como um elemento simples, e que apenas incluía a resolução de boatos ou de mal entendidos sobre as entidades: Doorley & Garcia (2007) mostram-nos a Reputação como o somatório das imagens da organização, que, por isto, implicam a Perfomance, o Comportamento e a Comunicação da Organização. Tendo esta mesma reputação um impacto tão elevado naquilo que sãos os benefícios tangíveis e intangíveis das entidades, não tem justificação não lhe dar o devido valor, nos dias que correm.

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Também não tem justificação não credibilizar os Media pela força que detêm na opinião pública hoje em dia: uma menção negativa acerca de determinado produto pode quebrar significativamente as vendas; uma apreciação positiva sobre determinada organização pode levar ao aumento de interesse face à mesma. Aquilo que vem noticiado já esteve na origem de motins, de celebrações e outras tantas formas de organização social. O que se produz é transmitido pelos Media e tem repercussões reais na sociedade – isto porque não se fecham em si mesmos; são tanto o meio como o público-alvo. E os profissionais de Relações Públicas têm conhecimento disto mesmo: para as organizações, os Meios de Comunicação Social representam a difusão mais acentuada da opinião pública, pela sua capacidade de divulgar, com um alcance abismal, livre informação sobre as marcas e empresas, quer seja em referência direta, quer seja de forma diluída em conteúdos.

Qualquer meio de comunicação, seja um jornal ou outro formato, funciona como um autêntico filtro de informações: constrói-se na capacidade de sintetizar o que acontece no mundo para uma determinada audiência (Assad & Passadori, 2009). Esta é uma realidade que as empresas e organizações não devem nunca negligenciar, e o mundo empresarial e organizacional está cada vez mais ciente deste panorama: a resistência em estabelecer um relacionamento saudável e duradouro com os Media tem-se vindo a quebrar, pelo facto de, finalmente, se ter compreendido o risco da publicação de versões distorcidas nos Media, ou de más críticas, que podiam ter sido evitadas se estivesse contemplada uma estratégia orientada para os Meios de Comunicação. Finalmente, começa a ser compreendido que lidar com o jornalista não é apenas tentar a promoção nos jornais, e que o investimento de recursos e pessoal nesta área não é um gasto supérfluo no orçamento organizacional, que se pode apenas fazer quando existem uns dinheiros a mais.

Estas questões materializam-se na disciplina a que podemos chamar Media Relations, que implica todas as formas de interação da organização com os Media (Doorley e Garcia, 2007). Inevitavelmente, esta área inclui também a habilidade de construir relações a longo prazo com os profissionais do meio – gerindo os seus contactos, procurando informá-los acerca da organização em questão, respondendo às suas dúvidas -, culminando, portanto, no desenvolvimento de procedimentos e métricas de monitorização e gestão dos Media.

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Esta construção de relações tem uma série de implicações bastante complexas, mas aquilo que se torna mais importante, segundo Doorley & Garcia (2007), é que a comunicação com os Media esteja centralizada – na medida em que é impensável que, dentro de uma organização, os seus membros digam coisas diferentes sobre o mesmo assunto, porque isto resulta em falhas de comunicação, potenciais conflitos, e, em último caso, problemas na reputação da organização. É crucial, por isto, reduzir o nº de pessoas que pode, dentro de uma organização, entrar em contacto com os Media para eventuais esclarecimentos de determinada situação. Por outro lado, é também importantíssimo que o contacto com os Media tenha em conta que estes profissionais não querem despender muito tempo a tentar compreender um determinado acontecimento, e que não irão falar sobre ele a não ser que este constitua uma história, apelativa e facilmente percebida. Não é do interesse das Relações Públicas – e, muito menos, do interesse da organização em si – que se repitam incidentes como o ocorrido na central Three Mile Island, aquando de um acidente nuclear a 28 de Março de 1979: os seus empregados não estavam completamente informados sobre o assunto, nem sabiam como agir numa situação do género, perante a azáfama de jornalistas. O incidente resultou na cedência de informação inconsistente quer sobre a causa do acidente, quer sobre o que estava a ser feito para o resolver – o que gerou confusão, mais pânico e a sensação de que ninguém sabia o que estava a fazer. A cobertura mediática do caso, que, por si só, já seria negativa devido à natureza da situação, só se agravou, devido às respostas obtidas.

Assim sendo, como pode o profissional de Relações Públicas representar uma fonte de informação relevante para os Media, ao mesmo tempo que garante que o conteúdo publicado vai ao encontro do que se procurava? Em casos mais urgentes, complexos e que exigem uma aparição pública que saiba dar resposta a questões eminentes, é comum recorrer-se a um porta-voz: um profissional escolhido previamente, que terá de estar informado sobre a situação sobre a qual irá responder e que, assim, dará a cara pela organização em questão. Um profissional com tal cargo não poderá, assim, dar-se ao luxo de não dispôr de qualidade que o classificam como tendo bons instintos e capacidades de comunicação, sendo capaz de lidar com eventuais críticas, sendo honesto e compreensivo e sabendo lidar com a pressão. Espera-se que, a partir deste porta-voz, haja um engagement perfeito com os Media, na medida em que este consiga tanto dar resposta aos jornalistas como representar benefício para a organização.

De facto, se recorrer a um porta-voz é comum, porque continuam a existir problemas entre as organizações e os Media? Muito do atrito que é formado entre as duas partes provém do medo que, muitas vezes, os profissionais encarregues de Media Relations sentem em relação aos jornalistas: “e se me citarem e eu não tiver dito o que queria, como queria?”; “e se me pressionam e eu dou informações que não quero?”; “e se me fazem perguntas a que não sei responder?”.   Todas estes receios são legítimos, e o ideal também não é que se subestime a força de um jornalista. No entanto, isso não é razão que justifique uma má prestação: a disciplina de Media Relations implica uma atividade de investigação bastante exaustiva, tanto da situação que vamos esclarecer como dos potenciais jornalistas com que vamos contactar. Não está sequer em hipótese que um indivíduo sem pleno conhecimento dê voz à organização. Assim, ter receio de ser citado pelos Media é igual a ser um vendedor e pedir que não comprem os seus produtos; só se deverá falar acerca do que se tem conhecimento de causa e, nesse sentido, ser citado só pode ser uma mais valia. Da mesma forma, ter receio de dar informações que não sejam as supostas não se aplica: é usual que o jornalista faça pressão para obter as respostas que pretende – por vezes até ameaçando com um “vou fazer a notícia na mesma, quer me responda quer não” -, mas este receio não se pode sobrepor nunca aos interesses da organização e, muitas vezes, não é possível dar todas as informações – por razões, muitas vezes, aliadas à segurança da organização e/ou da sociedade. Por fim, se chegar o momento em que não se sabe responder a determinada pergunta, o ideal é manter a honestidade: um “não sei” soa sempre melhor que uma mentira.

Ainda assim, mais importante que saber formar um porta-voz ideal, é importante que as Media Relations sejam olhadas sob a forma de relações contínuas e duradouras, de confiança mútua. Pensamos muito no jornalista como quem tem o poder na relação Relações Públicas-Media, mas isto não tem de ser regra: o sucesso das Media Relations depende de conseguir mostrar aos jornalistas as nossas capacidades de comunicação e persuasão, de nos mostrarmos convincentes e credíveis, de termos uma História de qualidade e que vale a pena ser notícia e – mais importante que tudo – estarmos preparados. A reputação da organização é acumulativa, pelo que, perante uma crise, não é organizar determinada conferência de imprensa ou comunicado que a resolve: o êxito está diretamente relacionado com a capacidade de prevenção que está intrínseca na construção de relações com os Media.

No entanto, continua a existir uma questão a que tenho dificuldade e relutância em responder:  e os Social Media? Se a imprensa escrita e online já era difícil de controlar e compreender, o que podemos dizer destes utilizadores das redes sociais, que acreditam ter em si o poder da palavra e da opinião e que, por isso mesmo, arrastam outros milhares para acreditar no mesmo? Mais recentemente, o Facebook foi acusado de permitir que campanhas anti-Trump fossem impulsionadas e, ao mesmo tempo, que as anti-Hillary fossem suprimidas. Como podemos medir as consequências na reputação das entidades e organizações, de plataformas tão pouco controláveis? Esse torna-se o verdadeiro desafio do nosso século, mas que apenas será possível quando se dominar, primeiramente, as Media Relations.

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